A mensagem de que o acolhimento residencial a longo prazo não constitui o melhor interesse dos órfãos e das crianças vulneráveis está se espalhando. Como resultado, muitos orfanatos ao redor do mundo estão se transformando em centros que oferecem serviços de fortalecimento familiar e comunitário. Esse processo é muitas vezes chamado de “transição”. Rebecca Nhep, diretora da ACC International Relief, descreve como essa mudança pode ocorrer.
Mudança na maneira como prestamos assistência
Se você apoia ou dirige um orfanato ou centro de acolhimento infantil, a ideia de fazer uma transição para um programa familiar e comunitário pode ser muito assustadora. Ela suscita muitas perguntas, como: “Em que consiste uma transição?”, “Como posso ter certeza de que as crianças estarão seguras e receberão bons cuidados em uma família?”, “O que acontecerá com a educação ou religião da criança?, “O que meus doadores acharão?”, “O que acontecerá com nosso prédio, se não houver crianças vivendo nele?” e “O que restará do meu ministério quando não formos mais um orfanato?”
Às vezes, essas perguntas e preocupações parecem ser obstáculos que nos impedem de mudar. No entanto, com um bom planejamento, o apoio certo e processos bem desenvolvidos, você pode garantir que a transição seja eficaz e segura para as crianças. Além disso, na verdade, você verá seu programa ou ministério crescer em alcance e sucesso.
O programa Kinnected, da ACC International Relief, ajuda organizações locais e internacionais na transição de seus programas de acolhimento residencial. Ao longo dos últimos seis anos, trabalhamos com mais de 60 centros de acolhimento residencial, em 11 países diferentes.
A história do Pastor Myint Nwe mostra alguns dos passos-chave da transição. Este é apenas um exemplo de como o processo pode funcionar.
Perceber a necessidade de mudar
O Pastor Myint Nwe é o diretor da Caring and Loving Children (CLC), uma organização comunitária de Mianmar. Ele já foi responsável por cinco centros de acolhimento residencial espalhados pelo país. Muitas das crianças dos centros tinham parentes vivos, mas haviam sido encaminhadas à organização por motivos de pobreza extrema, morte de um ou ambos os pais ou outra situação de crise.
Ao longo do tempo, o Pastor Myint viu que o acolhimento residencial não é o ideal para as crianças. Ele percebeu que, sempre que possível, as crianças devem estar em uma família. No entanto, ele não era um especialista e não possuía os conhecimentos necessários para guiar os centros pelo processo de transição e reintegrar as crianças na comunidade. Assim, o Kinnected aceitou apoiar e orientar a CLC em sua transição para o acolhimento familiar.
Ponto a salientar: Estar convencido da necessidade de mudança é essencial.
Preparação dos participantes-chave
Primeiro, o Kinnected ajudou a CLC a pensar em preparar participantes-chave antes de fazer mudanças significativas. Estes incluíam doadores, membros do conselho diretor, funcionários, líderes comunitários e funcionários do governo local.
Ponto a salientar: é importante educar todos os envolvidos sobre a necessidade de transição para o acolhimento familiar e como ela pode ser feita. Enfatizar os benefícios para as crianças pode ajudar a convencer as pessoas.
Desenvolvimento da capacidade
O próximo passo que o Kinnected tomou foi desenvolver e fortalecer a capacidade do Pastor Myint como líder da CLC. Começando em 2013, ele fez uma visita de campo para se encontrar com outro parceiro do Kinnected que fazia um trabalho de fortalecimento familiar em um contexto semelhante. Isso o ajudou a perceber por si mesmo os benefícios de reunir as famílias, providenciar colocações em famílias de acolhimento ou com parentes e entrar para redes de pares.
Ponto a salientar: É importante que os líderes de orfanatos imaginem como seria a transição na sua comunidade. É provável que eles precisem de treinamento adicional em tópicos como proteção infantil, desenvolvimento infantil, gestão de casos, acolhimento familiar e monitoramento e avaliação. Eles devem criar vínculos com departamentos governamentais e outras organizações que trabalham com o bem-estar infantil para poderem trabalhar bem juntos.
Planejamento para a transição
Juntos, o Kinnected e a CLC desenvolveram um plano para a transição da organização. O plano incluía escrever sua missão, visão, pontos fortes, direção e metas futuras, resultados a serem medidos, atividades, recursos e áreas onde a CLC precisava aprender ou adquirir experiência. O Kinnected treinou os funcionários da CLC para garantir que eles apoiariam o processo e teriam o conhecimento e as habilidades certas.
Ponto a salientar: é vital desenvolver um plano de transição detalhado para a instituição. É importante contratar assistentes sociais e garantir que eles tenham as habilidades certas. Os profissionais podem precisar de treinamento em como trabalhar com crianças vulneráveis e seus cuidadores. Os tópicos podem incluir levantamento, avaliação, localização de familiares (maneiras de encontrar os parentes das crianças) e mapeamento dos serviços disponíveis.
Etapas da transição
Sempre que possível, o Pastor Myint rastreava os familiares das crianças sob seus cuidados. Ele e sua equipe, então, analisavam sua adequação e disposição para oferecer o acolhimento adequado.
O Pastor Myint sabia que a pobreza era o motivo pelo qual algumas das crianças haviam sido colocadas nos centros de acolhimento institucional. Assim, ele ajudava os familiares a iniciar pequenos negócios, como alfaiatarias, mercearias e criação de animais. As famílias também podiam ser vinculadas a sistemas de apoio ou outros serviços comunitários.
O Pastor Myint começou com três orfanatos onde a igreja doadora tinha grande interesse em fazer a transição. Havia um total de 53 crianças nestes centros. Até agora, ele já reintegrou duas crianças de volta em suas famílias biológicas e 22 com parentes. Dois outros adolescentes mais velhos passaram para uma a vida semi-independente.
Ponto a salientar: É importante manter as crianças seguras ao longo do processo. As famílias devem ser devidamente avaliadas antes de receberem uma criança. Reintegrar as crianças em sua família original é o ideal, mas se isso não for seguro ou adequado, devem-se explorar outras opções. Estas podem incluir o acolhimento por parentes, famílias de acolhimento e adoção.
É desenvolvido um plano de assistência com cada criança e para cada criança, destacando o que precisa ser feito para prepará-la para o acolhimento. Depois disso, é criado um plano de apoio familiar. O plano faz uma lista das mudanças e apoio necessários para permitir que a criança e a família façam uma transição bem-sucedida.
O Pastor Myint e o assistente social da CLC monitoram regularmente todas as crianças que foram colocadas em famílias. O processo de monitoramento torna-se menos frequente ao longo do tempo nas colocações que estão funcionando bem, até que o caso da criança seja encerrado. Este processo leva pelo menos 12 meses, às vezes, mais. O monitoramento é feito pessoalmente, às vezes com telefonemas entre as visitas (especialmente no caso de crianças em áreas remotas). Se as visitas revelarem a necessidade de apoio adicional, os assistentes sociais organizam a ajuda necessária.
Ponto a salientar: Depois que as crianças são reintegradas em suas famílias, o monitoramento é vital para garantir que a colocação seja estável e a criança esteja segura.
A CLC já fechou completamente seu primeiro orfanato. O orfanato fez uma transição para clínica de saúde familiar e centro de aprendizagem comunitária. O centro oferece treinamento profissionalizante, que ajuda os membros da comunidade a encontrar emprego ou iniciar seus próprios pequenos negócios. Isso pode ajudar, antes de tudo, a prevenir o colapso da família.
O Pastor Myint também criou um serviço de emergência de acolhimento para oferecer acolhimento temporário às crianças abandonadas ou abusadas. Essas crianças são encaminhadas pela polícia local ou pelos líderes comunitários. O Pastor Myint e seu assistente social, então, iniciam o processo de rastreamento familiar e avaliações. Eles procuram encontrar uma colocação familiar adequada e segura para a criança, através de reintegração familiar, acolhimento por parentes ou famílias de acolhimento.
Ponto a salientar: Quando os centros de acolhimento residencial fazem a transição, os prédios e recursos podem ser usados para prestar serviços de fortalecimento familiar e comunitário.
Parcerias
O Pastor Myint agora é um defensor do acolhimento familiar e compartilha suas experiências com outros diretores de orfanatos. Ele faz parte do grupo de trabalho de assistência alternativa em Mianmar.
Rebecca Nhep é co-Diretora Executiva e Chefe de Programas Internacionais da ACCI Relief.
Site: www.kinnected.org.au
E-mail: [email protected]
Endereço: 5/2 Sarton Road, Clayton, Victoria 3168, Austrália
Telefone: +61 3 8516 9600
Este artigo foi parcialmente adaptado a partir do documento Replicable models for transition to family-based care (Modelos replicáveis para a transição para o acolhimento familiar) da CAFO. Veja www.cafo.org/resource/replicable-models-for-transition-to-family-based-care
“gostaria que meu orfanato fizesse a transição! e agora?”
A maioria dos orfanatos precisam do apoio técnico de uma organização como o Kinnected para ajudá-los a fazer uma boa transição. Este apoio permite-lhes estabelecer as estruturas adequadas para uma transição segura.
O Kinnected atende a pedidos de informação de orfanatos interessados em fazer a transição (veja os dados para contato abaixo). O Kinnected, então, estuda o nível de apoio que pode oferecer.
Um recurso útil é o manual Transitioning to family care for children (Transição para o acolhimento familiar para crianças) da Faith to Action. Visite www.faithtoaction.org/resources para baixar um exemplar gratuito.