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Participação de crianças

Paul Stephenson. ‘Foi realmente maravilhoso. Até hoje ninguém havia feito isso dessa maneira. Agora nós sabemos quais são as coisas boas e ruins na nossa comunidade e decidimos o que podemos fazer para melhorá-la.’

1999 Disponível em Inglês, Francês, Espanhol e Português

De: Participação de crianças – Passo a Passo 38

Como incentivar as crianças a compartilhar seus pontos de vista e participar das atividades comunitárias

Paul Stephenson.

‘Foi realmente maravilhoso. Até hoje ninguém havia feito isso dessa maneira. Agora nós sabemos quais são as coisas boas e ruins na nossa comunidade e decidimos o que podemos fazer para melhorá-la.’

Essa poderia ser a reação de um adulto que, pela primeira vez, foi incluído no processo de identificação de necessidades de uma comunidade. Essa declaração está cheia de esperança e de desejo em fazer mudanças. Contudo, essas palavras foram ditas por Sreevalli, uma menina de 14 anos que mora no interior da Índia. Ela tinha acabado de terminar uma série de atividades participatórias, que duraram um dia inteiro, com outros membros do clube infantil do povoado onde mora. As atividades tinham por objetivo ajudar as crianças a identificarem as necessidades da comunidade, colocá-las em ordem de prioridade e desenvolverem um plano de ação para atendê-las. Como resultado desse processo, as crianças desenvolveram planos ambiciosos para melhorar as condições de higiene e a eliminação do lixo, para pedir que as autoridades providenciem transporte público mais freqüente e seguro para ir à escola e para melhorar as áreas de lazer. Elas também identificaram coisas positivas na comunidade, das quais ficaram orgulhosas.

Existem milhões de vozes como a de Sreevalli ao redor do mundo. Vozes de crianças trabalhadoras, crianças que vivem nas ruas, crianças que vão à escola, crianças com deficiências, crianças que correm o risco de serem abusadas e exploradas, e crianças órfãs que tomam conta das suas famílias. Muitas crianças assumem responsabilidades enormes, enfrentam grandes riscos e contribuem de maneira considerável para a receita e a sobrevivência das suas famílias. No entanto, as suas vozes raramente são ouvidas pelas comunidades e agências que procuram ajudá-las.

Com que freqüência as organizações que trabalham para o bem das crianças pedem seriamente a opinião das mesmas sobre o tipo de apoio que seria mais benéfico para elas?

Se criássemos condições para que as crianças fossem ouvidas durante o planejamento de projetos, a eficácia dos mesmos seria aumentada? Que outros benefícios poderíamos ter através do envolvimento das crianças no processo de planejamento e ação em desenvolvimento comunitário?

Muitos adultos acham difícil envolver as crianças no trabalho que realizam. Em conversas mantidas com pessoas em várias partes do mundo, elas compartilharam receios comuns no que diz respeito à participação de crianças:

  • A autoridade e orientação dos pais ou de outros adultos pode ser enfraquecida.
  • As crianças já possuem ‘poderes’ ou direitos demasiados e desrespeitam os mais velhos.
  • Aparticipação de crianças vai contra a cultura de muitos países.
  • A infância deve ser protegida – a participação faz com que as crianças se tornem ‘pequenos adultos’.
  • As crianças devem ser resguardadas das responsabilidades dos adultos – uma quantidade demasiada de crianças já trabalham e têm grandes responsabilidades, apesar de serem tão jovens.

‘A criança tem o direito de expressar uma opinião e ser considerada em qualquer assunto ou procedimento que a afete.’ Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança: Artigo 12

O potencial das crianças

As organizações geralmente só consideram o que elas e a comunidade podem fazer pelas crianças, ao invés do que as crianças podem fazer pelas suas comunidades. Nos projetos de desenvolvimento comunitário, as crianças são deixadas de fora dos processos de tomada de decisões. Isso é devido principalmente ao fato dos adultos acharem que sabem o que é melhor para as crianças, e também porque a maioria dos programas só prestam assistência aos adultos. Além disso, a contribuição das crianças ao trabalho de desenvolvimento acaba não sendo notada. As crianças são vistas como uma mão-de-obra obediente e que não reclama.

No entanto, a Bíblia contém alguns exemplos que mostram claramente a capacidade das crianças em assumir responsabilidades e posições de liderança. O jovem rei Josias, por exemplo, aproximou o seu povo novamente a Deus (2 Reis 22:1-2), e Davi defendeu Israel diante de Golias (1 Samuel 17:29-33). As crianças também foram ouvidas. Eli ouviu cuidadosamente o que Samuel tinha a dizer, depois que Deus escolheu falar diretamente com ele. Acima de tudo, Jesus recebia as crianças de uma maneira que surpreendia os adultos.

As crianças são caracterizadas pela franqueza, entusiasmo, amor, desejo de aprender e idealismo que possuem. Reconhecer as qualidades das crianças fará com que o seu potencial aumente para que se tornem agentes de mudanças nos seus lares, escolas e comunidades. Existem muitos exemplos (ex no processo De Criança para Criança) de crianças que ensinam princípios básicos de saúde aos seus irmãos e irmãs e chegam até a ensinar os seus pais a lerem e escreverem. Na Índia e no Peru, alguns movimentos formados por crianças ajudaram a mudar políticas governamentais após elas terem expressado as fortes opiniões que possuíam sobre questões sociais e direitos da criança. As crianças tomam conta das suas famílias em muitas comunidades ao redor do mundo devido a uma série de fatores, incluindo as guerras, os desastres naturais, a AIDS (SIDA) e a desestruturação familiar.

Nos casos onde as crianças participaram no planejamento, atividades e avaliações de projetos, o papel delas teve muito valor. É importante desenvolver maneiras pelas quais as crianças sejam ouvidas, em negociação com os pais e a comunidade. Esse processo também incentiva as crianças a aprenderem, de maneira prática, sobre o processo democrático e o papel que possuem como cidadãs.

O que aprendemos?

Durante os últimos dois anos, eu visitei uma variedade de projetos, nos quais as crianças têm um papel chave na realização das atividades. O exemplo de Sreevalli mostra alguns dos benefícios que se pode obter:

  • O interesse pelas crianças pode tornar-se um catalisador para ações comunitárias mais amplas.
  • As crianças podem dar opiniões inigualáveis sobre a comunidade onde vivem.
  • As crianças podem formar associações, clubes e redes que incentivem ações coletivas, desenvolvam habilidades úteis para a vida e construam relacionamentos.
  • As crianças aprendem habilidades e responsabilidades através de uma participação eficaz.
  • As ações realizadas em parceria entre as crianças e os adultos criam confiança e responsabilidade.
  • Os níveis de corrupção e discriminação contra mulheres e grupos tribais são reduzidos durante uma atividade, quando as crianças são envolvidas.

Princípios indispensáveis

Incentive a participação total das crianças

As crianças podem participar em diferentes níveis e com vários tipos de apoio por parte dos adultos. A idade, capacidade e situações culturais em que se encontram precisam ser consideradas. A participação precisa ir além do simples fato de incentivar as crianças a aderirem a certas atividades; elas devem iniciar ou fazer parte dos processos de planejamento e de tomada de decisões.

A identificação das necessidades das crianças

É necessário precisa incluir a opinião delas desde o começo, ao invés de ser uma reflexão tardia. Procure compreender os papéis assumidos pelas crianças nos seus lares e comunidades, e quais questões são relevantes para elas. Permita que as crianças identifiquem as suas próprias necessidades e interesses, pois assim o trabalho de desenvolvimento poderá começar a partir das capacidades que elas possuem e fará uso das suas qualidades positivas, em vez de enfatizar as suas debilidades.

Planeje e avalie

Use métodos participatórios para incentivar as crianças a contribuírem no planejamento, monitorização e avaliação dos projetos ou atividades, para que informações necessárias possam ser coletadas. Métodos como o desenho e a dramatização poderão obter maior sucesso do que as discussões. Considere a aptidões das crianças, como ajudá-las a se sentirem confiantes e como protegê-las quando informações dolorosas ou difíceis forem compartilhadas.

Questões éticas

Incentivar a participação das crianças no trabalho de desenvolvimento ainda é uma idéia nova. Ainda não existem respostas para muitas perguntas. Envolver crianças nas atividades de desenvolvimento levanta questões éticas. Em muitos países, os pais devem dar o seu consentimento antes que pessoas de fora possam trabalhar com as crianças. As crianças e os pais devem compreender as razões e os efeitos de tal envolvimento. A participação não deve resultar no fato de alguém aproveitarse delas ou colocá-las em qualquer tipo de perigo.

Não tenha medo!

Os adultos podem achar difícil começar a trabalhar com crianças. Todas as seguintes atividades podem significar grandes desafios: criar uma situação descontraída, desenvolver bons relacionamentos, aprender novas maneiras de comunicar com as crianças e permitir que elas cometam erros como parte do processo de aprendizagem. No entanto, os resultados poderão fazer com que as crianças desenvolvam habilidades vitais que formarão o alicerce necessário para que ocorram mudanças sustentáveis nas comunidades e na sociedade em geral.

Paul Stephenson é o Consultor da Tearfund na área de Desenvolvimento Infantil. Ele trabalhou na América Central, na África Oriental, na Europa Oriental e na Índia. O endereço dele é o seguinte: Tearfund, 100 Church Road, Teddington, TW11 8QE, Inglaterra.

Ouvindo as crianças trabalhadoras de Honduras

‘Na cidade de San Pedro Sula, em Honduras, nós apoiamos um programa por seis anos que prestava assistência diurna a crianças trabalhadoras. O programa estava situado no mercado onde as crianças trabalhavam. Nós realizamos uma avaliação há aproximadamente um ano atrás. Pela primeira vez, perguntou-se às crianças o que elas pensavam e o que queriam. Os funcionários do programa ficaram bastante surpresos ao descobrirem que as crianças não queriam ir ao centro porque ele estava situado em um lugar muito perigoso. As crianças achavam que o centro deveria estar situado em um lugar bonito, pois assim, os pais delas não se importariam que elas fossem até lá à noite. Eu acho que esse é um exemplo muito bom de como é importante consultar as crianças na fase de planejamento, pois caso contrário, talvez as coisas não funcionem.’

Coordenador de Projetos da organização ‘Save the Children Fund’ para a América Latina

Órfãos no Uganda

A epidemia da AIDS (SIDA) no Uganda deixou muitas crianças sem os seus pais. Quando um homem falece, a tradição é que a casa e a terra sejam herdadas pela família do pai. Isso pode fazer com que as crianças e viúvas fiquem sem terras ou desabrigadas. Geralmente os familiares mais distantes não têm condições de tomar conta delas. O medo e a falta de compreensão sobre a AIDS (SIDA) também podem fazer com que as famílias culpem a viúva pela morte do marido.

Alfred, um menino de 14 anos, cuida da sua família, que é formada por três irmãos e irmãs menores. ‘A UWCM (Uganda Women’s Concern Ministries) encontrou-nos quando estávamos numa situação muito ruim, desamparados. Nós éramos quatro pessoas. O nosso pai faleceu durante a colheita de painço e a nossa mãe faleceu recentemente. O nosso irmão é doente mental. Nós moramos sozinhos, em um barraco, na comunidade. A comunidade não nos ajuda em nada. Na verdade, eles querem tomar as nossas coisas, até mesmo os nossos parentes.’

Hoje em dia, é comum que em muitos povoados, as crianças tomem conta das suas famílias. As crianças mais velhas atendem as necessidades das menores, trabalhando em plantações locais e cultivando as suas próprias roças de milho e legumes. A UWCM ouve as histórias das crianças e respeita as necessidades especiais que elas têm: ‘Eles nos deram uma enxada para cavar,’ diz Alfred, ‘e agora preparamos alimentos como o painço, a batata doce e outras coisas.’

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